quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Neo-Luditas: DemaZiado Umanos

Somos cegos. Surdos e mudos. E como bons Umanos não reparamos que temos que usar óculos para enxergar, aparelhos para ouvir e microfones para falar. E isso já faz algum tempo1. Estudamos e utilizamos persistentemente técnicas e métodos que abordamos a séculos, pouco são os Humanos que conseguem ver as potencialidades das tecnologias empregadas ao livre arbítrio. Se dependemos a gerações de aparatos tecnológicos para concertar nossos velhos corpos biológicos, como pretendemos ser dignos de ser a única forma de inteligente a “dominar” a Terra? Parece ingênuo pensar que as maquinas não irão superar nossos processos de raciocínio e nossas estruturas baseadas em cadeias de carbono. E devemos ter orgulho de ter projetado tal forma de viva (por enquanto a enxergados como artificial).
Estamos em 2007, não sei se toda a humanidade sabe disso, por isso me parece um informação relevante. Um neo-ludismo2 inconsciente parece pairar sobre a contemporaneidade. Pessoas passam o dia trabalhando em frente a computadores e a internet , falam horas em celulares, utilizam carros com injeção eletrônica, fora os aparelhos citados no início, e mesmo assim não conseguem entender arte digital e admiram e produzem gravuras e pinturas que são discutidas no mundo das Artes a séculos (literalmente). Não podemos negar que existem milhares de interpretações e questões minuciosamente resolvidas sobre as técnicas e poéticas clássicas, mas insistimos em revelas na esperança romântica de “ir alem”. Questões contemporâneas exigem (EXIGEM) técnicas contemporâneas. Não posso falar de como a internet mudou minha vida em uma pintura a óleo! Se fala tanto em fim do preconceito mas não percebemos que somos inseguros perante o futuro próspero que esta sendo proporcionado pelas tecnologias. Caros artistas, críticos, filósofos, antropólogos, cidadãos, vistamos nossa roupagem maquínica sem preconceito! Vamos usar óculos, microfones, satélites, GPS, internet sem culpa! Olhemos em nossos calendários para acertar nosso calendários mentais. Nenhuma civilização descartou uma evolução tecnológica e não sejamos os primeiros a regredir.

1. Segundo Miguel Giannini, esteta ótico brasileiro e diretor do Museu do óculos Giconda Giannini, o filosofo chinês Confúcio foi o primeiro a relatar registros dos primeiros óculos aproximadamente 500 anos a.c., porém a ótica aparece realmente 1.400 anos depois. No final do século dezenove surgiu a primeira prótese auditiva elétrica, a partir da invenção do telefone por Graham Bell, em 1876. Emile Berliner inventou o microfone em 4 de março de 1877, porém o primeiro microfone usável foi inventado também por Graham Bell.

2. “Em março de 1990, Chellis Glendinning, psicóloga do novo México, publicou " Notas rumo a um manifesto neoludita", buscando das legitimidade aos que resistiam, por se sentirem incomodados, de um jeito ou de outro, ante a tecnologia da segunda Revolução Industrial; o texto lançou idéias afim de articular as criticas e objetivos do grupo.
"Os neoluditas têm a coragem de olhar a catástrofe total de nosso século, resultantes do fato de as tecnologias criadas e disseminadas pela sociedades ocidentais modernas estarem fora de controle e profanando a frágil teia da vida na Terra", escreveu a autora. Em seguida, sublinhando o elo com o passado, ela acrescentou: " Como os primeiros luditas, também somos pessoas desesperadas, procurando proteger as existências, famílias e comunidades dos que amamos, e que se encontram beira da destruição".
Argumentando que a eficaz resistência a esse processo " requer não somente regulamentação, ou eliminação de itens específicos - pesticidas ou armas nucleares", mas também " novas maneiras de pensar" e, em contrapartida, "a criação de uma nova visão de mundo".

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

O Destruidor Zoroastro

Dentre os elementos do eterno retorno Nietzscheniano, a destruição se destaca como elemento final e de recomeço, em um processo purificador do objeto transformado. Antagônicos e tão próximos, o inicio e o fim fazem uma paralelo entre o bem o mal, na busca de Zaratustra pelos enredos da moral. A destruição se aloca, através da moral, ao lado do maligno e consequentemente, o ruim. Os destruidores, para Nietzsche, aparecem ao longo do Livro “Assim Falou Zaratustra”, como aqueles que não podem ser classificados no campo do mal, e sim desprezadores deste conceito, assim como o do bem. O destruidor para alem do bem e do mal seria algo potencialmente mais corrosivo a moral.
O Destruidor Zoroastro viria primeiramente como a entidade que quebra as leis da moral, e sem esta, consegue destruir os limites impostos ao individuo, físico e em estado de consciência (imaterial), violar as leis físicas para voar, fazendo o que hoje a Realidade Virtual o faz, com estrema liberdade de mobilidade, projetando a consciência a estes novos mundos imorais por natureza. Os mundos virtuais anseiam por se tornarem espaço de liberdade por definição, destruindo preconceitos referentes a visualização do corpo off-line, localização geográfica, classe social, estabelecendo um outro (não novo) modo de respeitabilidade. O Ódio próprio e voltado ao coletivo, gerado pela intervenção das instituições de moral (moral herdada), assinalam a então prisão do instinto castrado.
No contexto dos Universos Virtuais o Avatar libertado da “moral do escravo” se torna o “Virtuelle-Übermensch”, o Super-Homem Virtual (extropiano exemplar), destruidor dos restos de do Deus, abre os portas (seriais) para o pós-humano, ainda não imoral, porém encharcado da promessa de liberdade. Por traz deste Avatar imaterial esta o haker, cidadão do on e off-line, que aplica a “imoralidade”, contrária a ética Protestante do capital, destruindo o horário comercial e construindo o paraíso cristão da vida eterna no infinito código binário extropiano.
Definindo o humano não como o final do processo evolutivo, mas como uma fase para a chegado ao pós-humano, Nietzche ressurge nos discursos contemporâneos impregnando Cyborgs e a cibercultura. No caminho da destruição do processo moral, o “Destruidor Zoroastro” desce da montanha virtual, portando dois números, um em cada mão, são eles 0 e 1, destruidores do real clássico e, de acordo com o eterno retorno, irão reconstruir os códigos de ética que aprisionam os instintos humanos.

O Ciberespaço Humanizado

A humanização das tecnologias computacionais está presente sobretudo na visualidade das interfaces e na ergonomia dos periféricos de interação homem/maquina. A visualização 3D on-line possibilita uma projeção dos sentidos em uma imersão em um espaço virtual. Espaço este que sem peso, sem distancia e com um outro tempo, nós faz quase literalmente desassociar corpo físico de consciência atuante. Na atualidade dezenas de mundos virtuais estão disponíveis para serem literalmente habitados. Não bastando a diversidade de mundos, há ainda dentros destes universos virtuais servidores diferentes que funcionam como realidades paralelas dentro destes universos específico. É o caso do game Line Age II, um mundo medieval on-line multiusuário, que reúne cerca de 100 a 500 usuários por servidor que atuam sobre um mundo virtual comum. Neste caso existem centenas de servidores paralelos atuando sobre uma mesma localização visual, que é atualizada e expandida a cada atualização do game. Outro exemplo da contemporâneidade é o Second Life, um universo on-line multiusuário, mas que funciona em um único servidor comum, porém a um número limitado de usuários por cada localidade dentro do mapa. Seguindo esta linha, cito o Entropia Project, um mundo virtual como os citados acima, que apresenta um futuro possível a humanidade, que vive em um planeta denominado Kalypso.
Os três exemplos recorrem a um imaginário tecnológico, onde através da tecnologia o humano cresce ou é abafado. A possibilidade de uma Era mágica (Line Age II), um novo espaço de atuação corpórea onde as leis físicas não atuam (Second Life), e uma projeção de futuro apocalíptico (Entropia Project) ressaltam linhas de pensamentos filo-sociológicos da atualidade.

LineAge II - Universos Virtuais/Reais

Este artigo pretende abordar questões relativas as comunidades virtuais conectadas e relacionadas com o Game Lineage II: The Chaotic Chronicle, um MMORPG desenvolvido pela NCsoft, onde o jogador experimenta o simulacro de um mundo sintético baseado em uma fusão de narrativas mitológicas, uma ressacralização para o reencantamento do Mundo, como cita Maffesoli.
No Game, um espaço tridimensional simula um grande continente onde os jogadores convivem on-line com outros jogadores, junto com Mobs, seres virtuais dotados de comportamentos autônomos regidos por sistemas de inteligência artificial. Neste espaço dezenas de players estabelecem uma relação social complexa, como as de poder, entre si e com os seres autônomos.
A característica de um regime social tribalista, é apontada por Maffesoli com uma das características da cibercultura e da pós modernidade, e se faz ativa no Game quando as subdivisões e hierarquias são montadas e sub-classes, não previstas na estrutura do Jogo ou pelo gamemaster, são instituídas por ações comuns entre os player. Consequentemente cada servidor constrói sua estrutura social de modo diferenciado, pois cada meta-universo é constituído por diferentes usuários. Segundo Lemos, a criação destes certames sócio-digitais vem como “expressão cotidiana da vida que se rebela contra as formas instituídas e cristalizadas”, onde as leis e códigos de conduta são ditados por um anseio de uma convivência diferenciada ao mundo off-line.
Ainda ao modo tribalista da convivência desta comunidade virtual, o Lineage II apresenta uma série de iniciações ritualísticas aos novatos que pretendem galgar uma posição fixa em um determinado Clã (grupo social fechado). Estas iniciações propostas pela programação prévia do jogo, são alteradas e modificadas pelos lideres dos clãns, conforme a conduta ideológica que este se apresenta. Estas tarefas ou quests servem para que o avatar ganhe pontos de reputação, uma outra importante característica das comunidades virtuais. A reputação respaldara o player em sua vivencia cotidiana, dando a ele poder de palavra, poder territorial e respeito por parte de outros clãs, como afirma o player Aevon:

“(...)duas características importantes: status, e reputação. (...) o char1 que tem um certo nível de reputação (adquirido com pontos que são ganhos conforme você ajuda ou lidera outros chars ou mesmo um clã)”2

Com a reputação como item de valor, vemos surgir um sistema de capital-afetivo, onde as redes de colaboração irão influenciar na vivencia do player no universo virtual, gerado uma esfera onde o biopoder independe dos criadores do Game ou do criador do servidor, surge então, uma nova classe de independência para a comunidade virtual do contexto.
Alem de assumir um papel através da escolha primaria de classe e raça, o player se doa a uma ação pelo grupo: alguns players de classe Buffer, por exemplo, não são gerreiros, feiticeiros ou artesãos, apenas tem o objetivo de curar e proteger os demais jogadores, fazendo a sua existência indispensável ao clãn, porem de atuação restrita no meta-universo. Maffesoli, mais uma vez, aponta a diluição da perspectiva individualista da modernidade em prol de uma coletividade, a organicidade da sociedade.
Quando perguntado sobre a passagem do off-line do circulo social para o on-line o avatar Aevon responde:

“(...) o jogo on-line ajuda no reencontro dos antigos jogadores de RPG de mesa, e também no contato de novas pessoas que gostam do mesmo estilo de jogo. Eu como exemplo jogava RPG de mesa com sete amigos e aos poucos com o passar do tempo eu e também eles foram se mudando para outras cidades e estados, então um deles resolveu criar um servidor de line age para nos continuarmos jogando juntos, então dai nasceu o Seven que é hoje um dos maiores clãs do servidor AWBR o qual eu tenho orgulho de ser o líder com o char chamado Aevon.” 2

Mais uma vez as “tecnologias de afeto”, produzem e fomentam o contato de aquecimento das relações sociais, transformando o PC gélido em uma maquina quente, meio de comunicação e propagação das sutilezas do humano.
Visualmente, o Universo de Lineage II se apresenta em um espaço tridimencional finito, onde a cada atualização do jogo são disponibilizados mais espaços de atuação com novas quests e itens. O game simula um continente com variação climática e de flora, que representa as diferentes paisagens do planeta Terra. Na questão temporal, os dias se apresentam mais curtos, porem a ação dos personagens e avatares se da em real time, “tempo produtor de experiências e imagens fluidas, que estão sempre passando, abertas ao acaso e ao acontecimento, mas também passível de controle e monitoramento.” 3
O espaço Virtual simulado se apresenta como espaço vivo, multisensorial, sensível a atuação dos player, e não somente passivo de reação. Consequentemente o jogador deixa de ser um mero espectador passivo e vira espectador-ator , que modifica o espaço e as atitudes dos outros players.
Em outra característica deste espaço sensível, o monitoramento constante se faz presente, ou melhor, onipresente. A qualquer momento do jogo um player pode contatar o Gamemaster, pois este, tem acesso a todas as conversar, transações monetárias e localização espacial dos avatares, que vigia e pune, cria e bane, em alusão ao Deus clássico.

1 – Char deriva da contração de Character, ou personagem do Jogador – Avatar.
2 – Trecho retirado de conversa em chat entre o Autor e os Jogadores no ambiente de jogo, nos meses de junho-julho de 2007.
3 - Conceito de Tempo real segundo Ivana Bentes.

Tecnologias da Incerteza

A tecnologia, hoje se remodela, tanto em conceito como em matéria. Consegue se desvincular dos conceitos modernistas, pragmáticos e taxativos. O Marxismo envolveu as idéias tecnológicas em narrativas de progresso, assim como, na modernidade estas eram encaradas com narrativas do esquecimento do ser, reduzindo o universo cognitivo a um modelo de desejo humano, se necessário excluindo seus próprios conceitos iniciais.
Em um momento histórico onde a certeza positivista (ou de esquerda) da lugar as tecnologias da incerteza, em que a ambigüidade somada a um acaso aparente, a internet, por exemplo, pode tanto ser vista do ponto celebrativo, trazendo a democratização, a livre troca de informações (sem gatekepper declarado), ou em um ponto de vista apocalíptico, onde o neonazismo encontra espaço para publicação e a sexualidade bizarra materializa sua existência assumida. O acaso (Heidegger) esta ativado neste sistema, o fluxo de informação vária e toma forma energética caótica e quase imprevisível, dentro de uma capacidade de potência da maquina.
A resistência e o medo destas “novas” (nada inéditas) tecnologias, na verdade faz parte de uma construção de um lugar comum, onde esta , em outra ambigüidade, materialização virtual do mundo imaginário (somando o imaginário ao religioso, ao sonhado,...), e a realização real e verdadeira destes conceitos abstratos.
A saída poderá estar em uma nova visão e leitura conceitual destas novas tecnologias, sem preconceitos nem paradigmas modernos. A potencialidade destas tecnologias são aparadas por conceitos que não conseguem abranger toda sua abrangência libertaria. De imediato podemos pensar na interface dos sistemas operacionais de maior uso: a mesa ou a desktop, é um exemplo nítido de como um conceito quase tão antigo quanto a própria historia da humanidade, encontra espaço em um suporte tecnológico atual que limita, no caso, o entendimento da amplitude de ação da interface do computador pessoal, transformando algo a priori sem limites físicos nem de atuação, é pragmatizado em uma superfície bidimensional, pobre ao potencial da maquina.
Talvez estas ligações entre uma nova tecnologia e conceitos antigos, esteja em uma segurança , em meio ao estar perdido na rede, ou sem um local de partida fixo, ou um local fixo para quando voltar. Até mesmo esta questão do ir e vir (questões relacionadas ao espaço-tempo convencional) estão suspensa neste caminhar constante das tecnologias contemporâneas. Como podemos pensar um ciberespaço sem pensar o infinito espacial? Ainda em mundos virtuais como o Second Life , que tem certo desapego com as leis físicas, apresenta ainda limitações que são só pertinentes a realidade concreta como a “casa”, as paredes das construções, não imateriais verdadeiramente e não transponiveis por um Avatar também imaterial.
As tecnologias do imaginário se efetivam materialmente nos meios de comunicação atuais, em um amálgama entre o cinema, televisão, internet, que agora (na pós-modernidade?) interroga a divisão entre estas categorias, assim como a arte que na contemporaneidade que tenta extinguir os antigos conceitos de técnicas isoladas e tende a uma idéia de hibridismo como produto final.
Estas tecnologias são subdivididas em de controle; de crença; do espírito; e da inteligência. Cada uma abrange uma parte deste imaginário coletivo, suspenso, mas influenciável na cultura de todas as épocas. A publicidade, sendo uma das principais tecnologias do imaginário contemporâneo atua como difusora do que Baudrillar chama de fenômenos extremos. Invés de persuadir o espectador, esta acaba por seduzi-lo, agregando um conceito dito como cult , ou outro axioma social positivo. Este expectador-consumidor participa de sua “dominação”, deixando de lado a velha manipulação de massa, e aderindo a causa do produto, tomando partido em um pensamento político e o propagando junto com a a marca. Somos livres para escolher as nossas dependências. Esta contribuição da publicidade cria símbolos, cada um com seu valor social, que será usado pela sociedade a serviço de uma coesão social.
Por final, esta mesma publicidade gera a mitologia das profissões, recriando alguns estereótipos da modernidade em mitos contemporâneos. Quem faz o produto de adesão e sedução é seduzido pela mitologia do técnico, equipado das tecnologias por ele empregada.
A cibercultura, instaura seu próprio imaginário (efetivado pelas técnologias), ao mesmo tempo que esta é também influenciada.

(O) culto maquinico - Parte 2

CAPITULO 1 – RECONHECIMENTO
Baterias carregadas.
Entre as tarefas, que estavam em ordem de importância, a de procurar informações sobre o que estava ocorrendo era a primeira. Seu sinal hi-fi vasculhava o ar em busca de alguma rede, mas nem ruídos eletromagnéticos eram captados.
Ausência de sinal. Esta com certeza não era uma das características daquele lugar em dias normais. Esticou ao máximo o alcance do hi-fi. Forçar o alcance iriam torrar suas baterias, e ele sabia que precisaria delas cheias para aquela lista de tarefas. Deixou então o sinal padrão, e seguiu por cima dos escombros, retornando a casa.
Dentro dela, andou até a parede do fundo da sala, admirando novamente a sombra nela projetada. Estendeu seu braço e encostou a ponta do polegar opositor sobre a fina camada escura. Carbono. Moléculas de nitrogênio, algum hidrogênio, e, em menor proporção, outros elementos polvilhavam a superfície. Seu processador ainda estava identificando os últimos elementos quando um fraco sinal cruzou seu receptor. Novamente potencializou sua antena de captação. Era uma rede. Fraca e com muitos ruídos, mas parecia trafegável. Juntou as pernas, inclinou, e sentou sobre elas. Posicionou os braços junto ao tronco, ficando ereto. Verificou novamente o sinal, e decidiu entrar, deixando seu corpo robótico executando um programa de espera.
Ao entrar na rede percebeu que esta se encontrava em freqüências precárias, o sistema de risco assinalava que existia perigo nesta conexão, pois alem de deixar a porta do corpo robótico entreaberta para vírus ou programas espiões, se a rede caísse poderia causar sérios problemas de memória e locação perspectiva, já que está estava agora a navegar nesta rede desconhecida e solitária.
Estava a procura usuários remotos, alguém com quem poderia estabelecer uma conversa para se informar da situação, e relatar o desaparecimento de seus humanos. Aparentemente todas as portas de saída estavam vazias, então decidiu ir diretamente a fonte do sinal. Chegando próximo identificou um padrão VRML-X, que significava que iria necessitar de um avatar para adentrar a fonte, pois esta estava programada em uma interface gráfica de um mundo virtual, muito comum na maioria das redes.
Decidiu usar o Avatar de um humano número 6, um modelo que vinha junto com o sistema operacional robótico, era standart, mas servia na maioria dos casos.
Enviou o protocolo de entrada, agora teria que esperar uma porta para a fonte. Após alguma demora foi aberta uma janela de boas vindas, tímida mas eficiente, com o código da conexão.
Conectado e “materializado” no universo virtual da fonte olhou ao redor: era como uma grande biblioteca mas aparentemente vazia. Seus sensores virtuais mostravam uma presença de um programa mestre, mas sem um avatar visível. Caminhou até uma longa estante, e ao fundo algo que parecia um livro vibrava entre totalmente visível e a desmaterialização. Através de seus sensores identificou o código que o tal livro emanava, e percebeu que era de alguma estrutura regida por inteligência artificial. Provavelmente algum robô estava tentando entrar por ali, tal como ele fez. Tentou conectar a este sinal, mas como estava oscilando, não conseguia estabilidade necessária para uma comunicação. Voltou então pelo longo corredor e foi até o balcão de informações, procurando algum dispositivo para se comunicar com o Codemaster. Ao perceber a atitude de busca do avatar o sistema do universo virtual se apresentou ao Avatar número 6. Enfim, este voltou seu olhar ao redor procurando o avatar da fonte e, pela porta de entrada, surgiu um avatar hibrido, característico dos seres viruais, e logo se posicionaram frente a frente. O Codemaster se apresentou, identificando-se com o programa regente daquele servidor. Antes mesmo de qualquer pergunta ou interrupção, adiantou que o servidor estava com problemas sérios, na verdade não ele propriamente, mas provavelmente os usuários que estavam praticamente todos desconectados. Os que ainda emanavam sinais oscilavam muito rapidamente e não obtinham freqüência para uma conexão segura. Ao acabar a frase o próprio Codemaster piscou. Uma janela de mensagem do sistema se abriu informando a instabilidade do sistema e sua queda eminente. Rapidamente o Avatar numero 6 andou a passos firmes até a porta de saída e ao olhar para traz viu o Codemaster sumir por completo. A porta de saída estava segura, o código estava limpo e liberou a desconexão sem problemas. Agora era só reativar o corpo robótico e fechar a conexão. Toda esperança de alguma informação foi frustrada. Realmente aquele sinal não era seguro, dado a baixa força de propagação.
De volta ao corpo robótico, logo percebeu que aquele sinal estava rapidamente sumindo até que parou de ser captado.
Voltava a estaca zero. Reativou seus mecanismos motores e sensores robóticos, retornado algumas baratas que se aproveitaram se seu estado estático para vasculharem a lataria, a procura de alguma coisa desconhecida. Novamente olhou para a sombra. Dando as costas a parede caminhou novamente para fora da casa, disposto agora a achar qualquer forma de inteligência, seja humana, virtual ou robótica.

(O) culto maquinico - Parte 1

Prólogo

Silencioso no canto estava.
Procurava entender a situação.
Primeiro a luz, o barulho e aquele vendaval.
Observava as baratas pelo chão, tontas e agitadas.
Quando o silencio chegou, olhou para o céu cinzento procurando brechas de luz solar.
Sua bateria duraria mais 19 horas. Ainda imóvel processava os dados dos atos a seguir.
Entraria em um estado de hibernação pois segundo seus cálculos aquela poeira toda demoraria exatamente 56 horas para se discipar, e assim poderia receber a luz solar e carregar as baterias completamente.
Achava estranho aquele acontecimento. Como não obteve a informação que aquilo ocorreria? Nunca um acontecimento desse o pegaria de surpresa.
Sabia quando o tempo estaria nublado ou chuvoso, assim recarregaria suas forças antes que isto acontecesse e poderia abastecer suas provisões.
Do chão, pegou uma barata. Calculou o potencial energético do animal e concluiu que caso fosse, poderia extrair uma pequena quantidade de energia de sua estrutura nervosa primitiva, só por precaução. Mas decidiu que não. Se acomodou próximo a uma tomada elétrica que não emitia energia e ali ficou.


56 horas depois

Saiu do modo Sleep exatamente no tempo calculado.
Se levantou, rugindo algumas peças.
As baratas continuavam ali.
Decidiu procurar seu humano mais cativo. Mas a configuração da casa havia mudado. A porcentagem vermelha da barra de alerta aumentou.
Cruzando o quarto do menino, notou mudanças bruscas nas configurações visuais da moradia, por vezes isto acontecia, mas estas mudanças estavam fora do padrão programado como usuais. Reparou a sombra de seu segundo humano na parede no final da sala, acelerando o passo para o contato direto. Porém quando chegou próximo a sombra notou que faltava uma coisa. O corpo que a projetava. O processador calculou novamente. Era uma sombra. Sem o humano que a projetava. Processou novamente em vão e sem resposta o sistema projetou algumas possibilidades como: poderia ser uma pintura do tipo rupestre, ou uma grafismo com denotação humorística, áreas complexas do comportamento humano.
Recebeu um sinal do sensor de suas baterias que deveria procurar o sol, para banhar suas placas foto-sensiveis aos raios luminosos.
Com uma rotação precisa, focalizou o céu e embora ainda cinzento, notou que alguns raios ultrapassavam as nuvens de poeira e chegavam ao chão.
Fez um reconhecimento visual da superfície e por cima de alguns entulhos conseguiu ficar exposto a luminosidade. Foi seguindo o movimento do raio solar, calculando seu curso e tempo. Por algum tempo foi trocando de feixe a medida que um se extinguia e o potencial energético de outro parecia mais relevante. E assim passou o resto da tarde daquela quarta-feira, 18 de setembro de 2064.

O Robô como meio e mensagem

O teórico Marshall Mcluhan não presenciou a era das redes proporcionada pela internet. Porem sua obra guarda potencialidades que esperam por novas (ou outras) conexões teóricas que podem aplicar seus conceitos aos mais recentes fenômenos comunicacionais. Ao postular uma dos seus mais utilizados conceitos na área da comunicação, “o meio é a mensagem” Mcluhan vislumbrou o quanto a mídia utilizada na propagação da informação pode interferir no seu conteúdo, transformando o modo de emitir a mensagem.
A cibercultura se apropria de mídias produzidos pelas tecnologias contemporâneas que impregnam e alteram o conteúdo da informação trocada de forma especifica, pois pela primeira vez na história das culturas as mídias estão se tornando inteligentes, corrigindo palavras e imagens, alterando conteúdos, organizando automaticamente, buscando novas referencias, enfim, alterando a mensagem original em prol de uma maximização da legibilidade. Os sistemas que utilizam Inteligência artificial apontam para um outro caminho na organização e busca de informação mas principalmente, apontam uma mudança no mídia que transmite a mensagem, transformando o emissor (meio) em um interlocutor sintético. A inteligência do meio se torna essencial no estado da arte da comunicação.
Na atualidade estamos cercados por meios de comunicação que ensaiam algum tipo de inteligência sintética de processamento de dados, dotados de Mindwares (A. Clark, 2001) que interferem no modo de transmitir e decodificar as mensagens. Os programas-mentais são mais que simples transmissores de mensagens, são catalisadores de experiências que adicionam e reorganizam a informação através de interfaces biotecnológicas. A mensagem-sensível produzida modifica-se ela mesma para adaptar-se ao receptor se transformando em mensagem-dispositivo, fundindo se a mídia que a pronuncia. A mensagem se aquece em meio das “tecnologias de afeto”, embora Mcluhan tenha classificado a forma de comunicação que “incluí” como frias, o ciberespaço mescla os meio quentes e frios dependendo da interface acessada.


Se os meios de comunicação antecedentes ao século XXI transmitiam a mensagem por reprodução*, as mídias deste século não apenas reproduzem automaticamente, mas sim se tornam um novo emissor, tornando a mensagem com um novo grau de absorção pelo receptor.




O robô como meio e mensagem

Pensando o robô como a concretização no espaço físico do Mindware, este se torna um meio de comunicação que possui intrinsecamente diferenças com as outras mídias. Alem da transmissão de mensagens de origem humana, os robôs se tornam comunicadores do ambiente, e tradutores da realidade que os sentidos humanos não alcançam. O robô se torna o meio e mensagem quando possui esta capacidade de mídia de ser transmissor/emissor de mensagens de usuários conectados a rede, de pessoas que tem contato (físico) na realidade off-line, de aparelhos eletrônicos emissores de sinal de inúmeras fontes, de seu próprio corpo robótico, do ambiente que o cerca e fundamentalmente, no processo de emissão, do modo que traduz estas mensagens, pois alem do expressão através da fala e outros métodos visuais, ele se expressa corporalmente, colocando um nível de sensibilidade da ação performática somado a mensagem.


*Vejamos o exemplo do telefone e da televisão: o primeiro reproduz a voz humana ou outro som na integra, mudando apenas a qualidade e as propriedades físicas da transmissão sonora, mas o conteúdo é o mesmo. No cão da televisão, o som e imagem gerados na fonte também são os mesmos reproduzidos nos aparelhos, salvo efeitos especiais e as novas tecnologias de simulação.