segunda-feira, 24 de novembro de 2008

A Chapa de Novembro

A chapa tinha sido desligada pela falta de gás depois do almoço. Pelas duas horas da tarde os funcionários da empresa fornecedora resolveram o problemas e agora eu a religava esperando seu aquecimento. Da janela do café eu via uma tarde quieta e ensolarada de céu azul que anunciava o inverno eminente. O frio do vento o denunciava. Era dezembro anunciado. Entrava em todos os cantos e aqui também. Era incrível com o tempo chegava em todos os lugares ao mesmo tempo. Varria novembro de um lado a outro do mundo, com a diferença criada pela hora dos homens. Este dezembro era especial. Era sozinho e fresco. Novo e desafiador. Estava encarregado de abrir um ano bom, não como os outros, mas especialmente bom. Não digo ótimo para não me precipitar. Não digo magnífico para não me decepcionar. Apenas bom e novo. A mudança como argumento. O Argumento como uma luta esperançosa. E finalmente a coragem do desapego. Final de novembro, início de século, a chapa ta quente.

Gozo Alheio

Qual a distância entre meus olhos e meu falo? Tenho certeza que não é tão grande, pois eu olhava nitidamente para ele, rodeado de pessoas que se utilizavam dele para gozar. Com o braço estendido, agarravam com a mão direita o ereto e festejavam, dando voltas ao seu redor. Eu observava quieto e sorridente a felicidade alheia. Disputavam um espaço no seu tronco para agarrar e desfrutar. No início eram alguns, depois muitos. Todos eles dançavam e gargalhavam ao redor do meu sexo. Sem a paciência da espera. Sem a delicadeza da partida. A brincadeira escondia a vontade, e a vergonha sumia em sorrisos. A felicidade de alguns foi a minha e a sede de outros minha imensa decepção. Mesmo assim me calei, engoli o choro e parti, olhando meu falo usado, despreocupado com os monstros criados e feliz pela verdade emergente.

Pensamentos Saborosos

Mesmo querendo não partilho todos pensamentos meus. Alguns deles guardo só pra mim. Não sei se são os melhores, mas são deliciosos. Me sinto nestes momentos de egoísmo velado com um chefe de cozinha: Algumas receitas ele divulga para saciar paladares sedentos e a fome simples de alguns. Mas alguns pratos, aqueles grandes de tão delicados ou nobres de tão complexos, ele faz só pra ele. Executa a receita com uma delicadeza singular, se dedica a si, procurando detalhes cruciais. Ao final, com tudo pronto, admira a obra e come pausadamente, deslizando os pedaços saborosos por toda extensão da língua. Como parte do processo, deixa o tempo apagar a receita de sua mente, esquecendo-se do modo de preparo, mas não da sensação causada por ele. Sou assim com meus pensamentos. Alguns não escrevo, degusto-os sozinho e depois os esqueço, deixando apenas o gozo de um dia os ter criado.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

A Sociabilidade da Cerveja - Uma Sugestão de Pesquisa.

Quando se fala na questão de sociabilidade entre uma garrafa de cerveja e uma dose de whisky, fica quase indiscutível que a cerveja é a que promove mais relações de contato.
Eu olhava por cima do balcão a um grupo de jovens que conversavam as alegras e um deles tomava whisky, o resto cerveja (s).
A Cerveja passa em mão em mão, volta para o centro da mesa, é um totem da atenção daquele espaço. Seu formato fálico estimula a imaginação sexy e não é difícil ver seus bebedores bulinarem os adesivos colados na garrafa como que a despindo ou acariciando-a.
A cerveja é coletiva. Vem em engradados, aos grupos.
A dose de whisky é individual. Ela não existe, é feita pelo barman.
Dificilmente se oferece uma dose de whisky a todos na mesa, pois o copo é único, diferente da quantidade de bocas que o desejam. Apesar de ter um grau alcoólico alto o whisky não consegue suprir a necessidade de limpeza dita como confiável, quando tomado em grupo. Já a cerveja é repartida em copos individuais o que propicia a higiene.
O jovem que tomava wiski na mesa realmente não partilhava de uma coletividade plena. Não tocava a garrafa nem participava de sua movimentação sobre a mesa. Ele estava de fora, e ia pagar mais caro por isso.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Eu nunca mais direi te amo!

Essa é Jaqueline.
Ela esta com pressa.
Mas ainda esta em dúvida. Pressa do que?

Ela acaba de sair do café l'Echanson e caminha decidida pela esplanada procurando a primeira entrada do metro. (então ela para; olha pra baixo) Pisca duas vezes, e pensa em suas ultimas palavras, ditas alguns minutos antes:
Eu nunca mais direi te amo!

É a vida!

De olhos serrados pela fumaça das frituras, o chapeiro a encara sem dizer nada. Desistiu de argumentar. Acha até que foi convencido.

Este é o chapeiro.
Ele esta com pressa.
Essa não é a historia de sua vida então vou falar só o necessário sobre ele.
Ele é amargo e canalha.

Chapeiro - Sempre gostei do barulho do botão giratório da chapa de fritura. Girava lentamente pra ouvir e sentir na ponta de cada dedo o “tec” sonoro e maquínico que ecoava por minhas digitais. Talvez seja por isso que tenho tanto prazer em ser chapeiro. Jaqueline apareceu na porta do Bistrô no momento em que eu ligava a chapa de fritura para esquenta-la, no início de uma manhã. Neste momento eu ficava estático observando a chapa metálica por uns vinte minutos, concentrado, vendo o ar sobre a chapa se torcer aos poucos. Mas não neste dia.Como disse, foi nesse momento que Jaqueline entrou, com passos firmes e decididos.

Jaqueline – Eu nunca mais direi te amo!

Chapeiro – Você nunca me disse isso.

Jaqueline – E nunca mais direi. Eu sou a culpada. Tente entender:

Chapeiro (em um pensamento de 3,2 segundos) – Preguiça. Ela nunca disse que me amava. Girassol. Cabelos curtos. Olhos turvos. Respirar fundo.

Jaqueline – O Amor que sinto, (...) sentia por você é meu. Só fui capaz de te amar bastante por que há amor em mim suficiente para isso. Estou recolhendo este amor agora. Ele volta a ser guardado em mim, para que um dia eu volte a desapertá-lo junto com outra pessoa que o mereça, ou melhor, que me mereça quando este amor estiver liberto. Quando ele esta livre sei que sou melhor, por isso o grande prazer que duas pessoas “amadas” sentem. Só que este amor não é pelo outro, e sim um amor interno que é liberado e torna a pessoa melhor. Estou sendo redundante. Me escute:

Chapeiro – Estou entendendo... não tenho participação nisso...

Jaqueline – Sim, tem. Como achei você merecedor de atenção maior, despertei o amor em mim para que pudesse te fazer um bem maior. Mas como não é mais merecedor, eu recolho todo o amor em mim, e vou embora!
Eu nunca mais direi te amo! Pois o amor é meu e vai embora comigo!

Jaqueline sacudiu o guarda chuva na mão direita, chamando a atenção do Chapeiro para as gotículas que se espalharam pelo chão do café. Girando sobre o calcanhar ela deu a ele as costas e saiu trotando sobre as botas de borracha.
Ao cruzar a porta e virar a direita ela sentiu pressa, e firmou o passo em direção a esplanada.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Como transformar um Homem Feliz em uma Canalha Amargo. Introdução.

Introdução.

Sempre gostei do barulho do botão giratório da chapa de fritura. Girava lentamente pra ouvir e sentir na ponta de cada dedo o “tec” sonoro e maquinico que ecoava por minhas digitais. Talvez seja por isso que tenho tanto prazer em ser chapeiro. Mas não contarei esta historia agora. Isso só é importante por que os pensamentos que seguem nas linhas abaixo começaram a me incomodar em um destes momentos, em que ligava a chapa de fritura para esquenta-la, no início de uma manhã. Neste momento eu ficava estático observando a chapa metálica por uns vinte minutos, concentrado, vendo o ar sobre a chapa se torcer aos poucos. Como disse, foi em um destes momentos que comecei a pensar como me tornara amargo. Amargo e canalha. E no decorrer dos vinte minutos, muita coisa passou a fazer sentido.



Esta é uma historia muito cara pra mim. Cara e dolorida. Tenha certeza, que se um dia você usar estes pensamentos, você realmente quer magoar alguém. Tenha certeza, pois é um caminho sem volta. Serve para homens, mulheres, infantes, ou qualquer outra categoria de pessoas do seu circulo social. Mas aplicar o que direi aqui não quer dizer que você não gosta da pessoa, ou se usarem com você, não quer dizer, necessariamente, que a pessoa lhe quer mal, pode ser apenas conseqüência de algo. Apenas conseqüência.

sábado, 23 de agosto de 2008

Pequenos contos do Senhor Jack - O Novo Chapeiro

O Novo Chapeiro

Silencioso no canto estava.

Observava com atenção as instruções de seu colega. Este, postado em frente a chapa de fritura, mostrava o quão delicada e especializada era a técnica de se fritar hamburgers. Demonstrava como deveria ser colocada a carne congelada sobre a chapa quente e quais eram as etapas de se montar o tal sanduíche. Ao terminar sua explanação, esticou o braço entregando a espátula gordurenta ao novo funcionário, que no canto da cozinha, formulava algumas questões sobre tais procedimentos. Ao pegar na espátula, pode sentir o deslizar de seus dedos sobre o metal e não pode esconder a expressão de nojo perante tal experiência. – Tens uma luva? Daquelas de plástico sabe? Descartáveis! – indagou o novo funcionário, enquanto procurava com o olhar algo para limpar a gordura entre seus dedos. O colega, desapontado com tal indagação, pois se a explicar, o que para ele, era o segredo e ao mesmo tempo o brilho que mais traduzia o desejo humano/animal sobre aquele objeto de desejo.

- Veja bem – iniciou a explicação pausadamente, focando a importância do que diria.

- Se eu te dou uma luva, destas de plástico ou de borracha, você ira manejar o hambúrguer com mais higiene, com certeza, e seus dedos não voltaram a sentir o deslizar húmido da gordura no metal da espátula. Porém digamos que, por acidente, você encoste a tal luva na chapa? Certamente o cheiro de borracha queimada subira no ar e atrairá a atenção dos clientes e faces de nojo se transformarão em reclamações e duvidas quanto a qualidade do produto! Veja que isso é um grave problema, ninguém come em um lugar que fede a plástico derretido ou a borracha queimada. Agora pense no mesmo acidente, o de encostar sua mão acidentalmente na chapa de fritura, se você estiver sem luvas, o cheiro da sua carne, da carne de seus dedos, irá se confundir com a fritura da carne do hambúrguer e nada acontecerá! Carne é carne, não da para distinguir a fritura da carne do lanche com a da carne de sua mão! – E com um olhar vitorioso, ajudado pelas sobrancelhas erguidas e um leve bico formado na boca, voltou a realidade e foi entregar o tal sanduíche para a mesa 3, enquanto a aprendiz limpava a gordura da mão em seu avental novo.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Peuqenos contos do Senhor Jack - O Homem da Cama

o Homem da Cama

Silencioso na cama estava.
Serrava os olhos para que ela não percebesse que ele estava acordado. Ela tinha saído da cama a uns 15 minutos ou mais. Ele, deitado no meio da cama, finja estar dormindo para poder pensar com calma no que tinha acontecido. Faziam seis anos que ele não a via. Mas logo percebeu que ela não tinha mudado em quase nada. Continuava aquela vagabunda dos tempos do segundo grau. Tinha emagrecido um pouco, isso tinha, mas aquela força maldosa de seus olhos castanhos, ainda continuavam, porém mais maduras e fortes. E ali, naquele quarto desconhecido, tudo parecia fazer mais sentido. Estava se segurando para não se apaixonar por ela novamente como a seis anos atrás. Tentava, mas não com muita vontade. Em seis anos tinha superado a dor da perda anterior e pensava, com malandragem, que poderia tirar proveito da situação. Digo malandro, como todo o homem jovem acha que é. Estava um pouco preocupado por que o sexo foi rápido demais. Mas ele achava que ela tinha gozado, pelo que pode perceber, ela não tinha por que fingir para ele. Para ele, pensou sorrindo de canto de boca, para o marido...
Ele se sentia bem. Vitorioso como um bom másculo. Viril e sacana, como um bom homem. Afinal quem tinha que ir embora dali a dois dias ela era. Ele apenas voltaria para a casa da mãe, a poucas quadras dali. E ali, esparramado sobre a cama fingindo estar dormindo, pensava no próximo passo. Como convence-la a voltar. Para cama ou para ele tanto faz. tinha superado a perda de seis anos atrás, e se achava capaz de ser mais esperto que a vagabunda.
Sentiu um vento frio entrar pela janela e viu, mesmo com os olhos semi-abertos, o pano podre da cortina se levantar. Respirou fundo e fechou os olhos para enfim dormir o sono dos pródigos, sem pensar no que ela fazia no outro canto do quarto.

O Canto da Vagabunda

O Canto da Vagabunda

Silenciosa no canto estava.
Pensava no que acabava de fazer. Vagarosamente torceu o pescoço para trás até alcançar a visão da cama. Estava nua e cobria com os braços os seios ainda rijos. Logo após visualizar a cama, e o sujeito que nela estava, voltou novamente o olhar para o canto da parede. Ainda podia sentir a pele húmida entre as pernas. Achava estranho, porém confuso demais para definir. Ela não tinha gozado, talvez estivesse tensa demais para isso, ou desacostumada a um corpo diferente junto ao seu. Tinha que voltar daqui a dois dias, deixar aquele canto e voltar a sua vida monótona e cansativa. Olhou novamente sobre o ombro. O homem dormia espalhado pela cama. Decidiu que tomaria um banho, mas não queria acorda-lo com o barulho do chuveiro. Neste momento percebeu que se sentia suja. Seu corpo então começou a exalar um suor fétido, que junto com o odor de sua virilha quase a fez vomitar. Se sentia suja mas nem dez banhos poderiam a limpar. Tapou o nariz com uma das mãos deixando amostra o seio direito e as marcas vermelhas deixadas pela barba mal feita do homem na cama. ainda bem que tinha dois dias e que quando voltasse ao lar elas já teriam sumido, mas bem que poderia disfarçar com aquele pijama mambembe ou passando aquele creme que, por sorte não jogou fora, pois irritava sua pele, provocando manchas vermelhas similares a essa. Tentava não pensar no futuro, tentou organizar uma fala para sua volta, mas desistiu sem muito interesse. Por um momento sua pele se arrepiou com o vento gélido que veio de repente pela janela, levantando o velho trapo que era usado de cortina. Pensou que o vento pudesse levar aquele mal odor de sua pele mas ao respirar com mais cuidado percebeu que não, que ainda estava suja.
E por fim sabia que aquela sujeira não iria sair tão cedo, que o líquido viscoso que escorria por suas pernas não sairia dali nunca, e que aquele homem na cama era apenas mais um.
Ele era apenas mais um homem que ela tinha o prazer sarcástico de devorar, e que ele, quando acordasse, seria mais um a deseja-la com aquele ciúmes doentio e uma paixão passageira, que só aquela vagabunda sabia invocar.